ROTHIA MUCILAGINOSA COMO AGENTE ETIOLÓGICO DE INFEÇÃO DO TRATO RESPIRATÓRIO INFERIOR – EXPERIÊNCIA DE UM CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO

Evento: XI Congresso Nacional de Patologia Clínica 

Poster Número: 051

Autores e Afiliações:

Rui Freitas-1, Paulo Dias Silva-2, Hugo Cruz-3, Maria Helena Ramos-3

1 – Serviço de Patologia Clínica, Hospital da Senhora da Oliveira, EPE

2 – Departamento de Diagnóstico Laboratorial, Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil, EPE

3 – Serviço de Microbiologia, Departamento de Patologia, Centro Hospitalar Universitário do Porto, EPE

Introdução

Rothia mucilaginosa (R. mucilaginosa), previamente Stomatococcus mucilaginosus, é um coco Gram positivo, anaeróbio facultativo, catalase variável e oxidase negativa, considerada parte da flora comensal da naso- e orofaringe. Recentemente, R. mucilaginosa tem vindo a ser implicada em diferentes tipos de infeções, não só em indivíduos imunodeprimidos, mas também em indivíduos imunocompetentes.

Objetivos e Metodologia

O presente trabalho teve como objetivo avaliar a valorização do isolamento de R. mucilaginosa como agente etiológico de infeção do trato respiratório inferior (ITRI) através de um estudo observacional retrospetivo, com a duração de 1 ano, num centro hospitalar universitário. Os dados foram obtidos através da consulta do sistema informático laboratorial e do processo clínico eletrónico dos doentes.

Resultados

Foram estudados 9 isolamentos de R. mucilaginosa provenientes de amostras do trato respiratório, nomeadamente expetoração (n=6), aspirado brônquico (n=2) e exsudado traqueal (n=1), colhidas por suspeita de ITRI em doentes com idade compreendida entre os 52 e os 79 anos, em regime de ambulatório (n=4), de urgência (n=3) ou de internamento (n=2). Os doentes apresentavam um ou mais dos seguintes fatores de risco: hábitos tabágicos (n=5), doença pulmonar obstrutiva crónica (n=5), carcinoma do trato respiratório (n=4), hábitos etílicos (n=2) e doença cardiovascular (n=1). A identificação bacteriana foi efetuada por espectrometria de massa através do sistema VITEK® MS (bioMérieux) em todos os isolamentos (n=9), assim como o teste de suscetibilidade aos antimicrobianos que foi realizado pelo método de difusão em gelose com tira de plástico impregnada com gradiente de concentração de antimicrobiano (n=9). Os resultados foram interpretados de acordo com os breakpoints clínicos do CLSI. 

As estirpes isoladas demonstraram perfis de suscetibilidade variáveis mantendo, no entanto, boa suscetibilidade ao trimetropim/sulfametoxazol (n=8) e às fluoroquinolonas (n=6), bem como razoável suscetibilidade à penicilina G (n=5) e à clindamicina (n=4). Os doentes apresentaram melhoria clínica após instituição de terapêutica antimicrobiana dirigida com β-lactâmicos (n=4) ou fluoroquinolonas (n=2). Curiosamente, no único caso em que foi assumida uma flora de contaminação e não se iniciou terapêutica antimicrobiana, verificou-se agravamento clínico.

Conclusões

As infeções por R. mucilaginosa encontram-se provavelmente subdiagnosticadas, pois este microrganismo pode ser erroneamente identificado ou simplesmente descartado como contaminante. Na medida em que R. mucilaginosa faz parte da flora comensal da naso- e orofaringe, o seu isolamento a partir de amostras do trato respiratório deve ser encarado com cautela e permanece controverso e desafiante, porém parece existir evidência crescente no sentido da sua valorização de forma criteriosa e individualizada, de acordo com os fatores de risco do doente, tais como tabagismo e doença pulmonar obstrutiva crónica. Apesar destes resultados, dado a amostragem pequena deste trabalho, são necessários mais estudos para corroborar a associação entre o isolamento de R. mucilaginosa e a ITRI, sobretudo na presença de determinados fatores de risco, bem como para determinar se a terapêutica antimicrobiana dirigida tem impacto na evolução clínica.

Declaração de conflito de interesses: Os autores declaram não existir conflitos de interesses