SPUR CELL ANEMIA - O DIAGNÓSTICO ESTÁ NO ESFREGAÇO DE SANGUE PERIFÉRICO
Evento: XI Congresso Nacional de Patologia Clínica
Poster Número: 053
Autores e Afiliações:
Miriam Nance Gonçalves Sousa, Helena Trinca, Cheila Plácido, Nídia Neves, Marlene Pires.
SESARAM
Introdução
A etiologia da anemia na doença hepática grave é multifatorial e uma causa menos reconhecida é a Spur Cell Anemia (SCA). A SCA é uma anemia hemolítica adquirida muitas vezes associada à cirrose hepática e caracterizada pela presença de células de esporão, que são uma forma extrema de acantócitos (contagem geralmente > 20% no Esfregaço de Sangue Periférico). É causada por uma anormalidade estrutural das membranas dos eritrócitos devido à alteração da composição lipídica da membrana, levando ao sequestro e destruição esplénica. A exclusão de outras causas de anemia hemolítica relacionada com doença hepática grave como Síndrome de Zieve ou Anemia Hemolítica com Equinócitos, é um passo essencial no diagnóstico da SCA. A presença de SCA é um indicador de mau prognóstico e apresenta alto risco de mortalidade. Atualmente, a única cura definitiva é o transplante hepático.
Caso Clínico
Homem de 58 anos, caucasiano, enviado ao SU pelo médico de família por quadro de hipotensão e icterícia. Negava hematémeses ou melenas. Tinha antecedentes de cirrose hepática alcoólica, HTA, obesidade, dislipidemia, e história de internamento recente por encefalopatia hepática. Ao exame objetivo o doente apresentava-se lentificado, com TA 85/51 mm/Hg e FC 77 bpm, abdómen globoso mas depressível. Analiticamente apresentava Hb 4.4 g/L, com VCM 113.2 fL, HCM 36.1 pg e RDW 18.5 %; trombocitopenia de 89 000 /μL; leucocitose de 16 300 /μL, com neutrofilia de 8 300 /μL e eosinofilia de 3 300 /μL. INR de 3.68, TP 52.8 seg, TTPa 48 seg e Fibrinogénio 55 mg/dL. LDH aumentada (410 U/L) com hiperbilirrubinemia (13.18mg/dL) predominantemente à custa da indireta (7.45 mg/dL). Acrescentou-se o doseamento dos Reticulócitos, que se revelaram muito aumentados (240 000 /μL – 19.2 %), Esfregaço de Sangue Periférico, que revelou anisopoiquilocitose com alguns acantócitos e esfero acantócitos e policromasia, e o doseamento de Haptoglobina (< 7.81mg/dL). Para exclusão de outras causas de anemia, foi acrescentado o doseamento de ferritina, acido fólico e vitamina B12 que se revelaram dentro do intervalo de referência. O perfil lipídico foi avaliado, para exclusão de Síndrome de Zieve como causa de anemia hemolítica, não tendo revelado hipercolesterolemia (HDL 13mg/dL e LDL 29.8mg/dL) ou hipertrigliceridemia (triglicerídeos 61mg/dL). Foi pedido o apoio da Gastroenterologia, que excluiu hemorragia digestiva alta como causa da anemia, por endoscopia digestiva alta. O teste de Coombs (direto e indireto) foi negativo, excluindo-se uma anemia hemolítica de causa imune. Atendendo à doença hepática grave, associada a parâmetros bioquímicos sugestivos de hemólise, reticulocitose e presença de acantócitos e esfero acantócitos, admitiu-se como diagnóstico mais provável a SCA.
O doente foi internado na UCI, submetido a várias transfusões de CE, com agravamento progressivo do estado geral e óbito, após 9 dias de internamento.
Conclusão
Este caso destaca a importância do reconhecimento da SCA como causa de anemia na doença hepática grave, bem como a importância do esfregaço de sangue periférico que, revelando alterações morfológicas sugestivas, deve desencadear uma série de avaliações reflexas, complementando o diagnóstico. O tratamento de SCA é um desafio e o papel do transplante hepático pode ser atribuído à normalização do metabolismo lipídico ou à diminuição da HTA portal e do hiperesplenismo após o transplante.
Declaração de conflito de interesses: Nada a declarar
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