CASO CLÍNICO: LINFOMA DIFUSO DE GRANDES CÉLULAS B COM ENVOLVIMENTO DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
Evento: XII Congresso Nacional de Patologia Clínica
Poster Número: 019
Autores e Afiliações:
João A. Pinto, Maria Cristina Marques.
Serviço de Patologia Clínica – CHUSJ
Introdução: O linfoma difuso de grandes células B (LDGCB) é responsável por ~25% dos linfomas não-Hodgkin (LNH). Habitualmente é um tumor primário agressivo, mas também pode ter origem em linfomas indolentes. A localização extranodal mais comum é o trato gastrointestinal. O envolvimento do sistema nervoso central (SNC) é possível, mas raro, tanto na forma primária (<1% dos LNH) como secundária (2,3-4,5% dos LDGCB, ao ano de diagnóstico).
Caso clínico: O doente é um homem de 55 anos, diagnosticado com LDGCB (estádio IV-B) após avaliação de uma extensa massa abdominal (desde o retroperitoneu até à região abdominopélvica). O estudo inicial revelou o seguinte: 1) estudo imunohistoquímico com índice proliferativo (Ki67) de 90%, positividade para CD20, BCL2, BCL6 e MUM1, e negatividade para CD10; 2) ausência de rearranjo do gene MYC. Não foi realizada imunofenotipagem de sangue periférico ou da massa abdominal. Após o diagnóstico, o paciente completou três ciclos de quimioterapia (R-CHOP). Um mês após o terceiro ciclo, o doente recorreu ao Serviço de Urgência com queixas de diplopia. Após avaliação, constatou-se protrusão ocular direita, ptose palpebral direita e paresia do nervo oculomotor direito. O hemograma revelou anemia (11,9 g/dL), trombocitose (677 x 109/L) e leucocitose (14,30 x 109/L, 81,1% de neutrófilos e ausência de células morfologicamente anormais). O estudo bioquímico relatou hipoproteinemia leve (proteína total 55,3 g/L; albumina 33,3 g/L) e aumento da lactato desidrogenase (LDH) (326 U/L). A tomografia computadorizada (TC) craniana mostrava assimetria das glândulas lacrimais e das bainhas dos nervos ópticos, mais proeminente à direita. A ressonância magnética mostrava imagens compatíveis com infiltração linfomatosa e a TC cérvico-toracoabdomino-pélvica identificou várias adenopatias de novo (pericárdio-frénicas, mesentéricas e retroperitoniais lateroaórticas). Perante os achados clínicos, suspeitou-se de recidiva do LDGCB com progressão para o SNC. O doente foi internado para estudo e realizou-se punção lombar. A avaliação bioquímica do líquido cefalorraquidiano (LCR) revelou aumento das proteínas totais (2,6 g/L), hipoglicorráquia (<10 mg/dL) e LDH aumentada (424 U/L). A avaliação citológica quantificou 517 células/μL: predomínio de linfócitos normais (59,0%) e presença de células mononucleadas atípicas de grandes dimensões (37,0%). A imunofenotipagem identificou uma população B anómala de célula grande (40,20%), positiva para CD19, CD20, CD23 (heterogéneo), CD38 (forte), CD79b, IgM e com restrição de cadeias leves lambda. Os seguintes marcadores foram negativos: CD5, CD10, CD11c, CD43, CD103 e CD200. Assim, confirmou-se a hipótese diagnóstica inicial (LDGCB). Foi realizada quimioterapia intratecal (metotrexato e citarabina), seguida de quimioterapia sistémica (R-HDMTX e citarabina). Infelizmente, não houve melhoria clínica. O doente faleceu 30 dias após a admissão devido a uma bacteremia multirresistente.
Discussão: Este caso clínico exemplifica uma rara invasão do SNC secundária a LDGCB. À admissão, o doente apenas referia alterações visuais e não apresentava expressão hematológica periférica da doença. Por isso, apenas uma forte suspeita clínica e uma adequada avaliação complementar permitiram estabelecer o diagnóstico. A imagiologia foi importante para sinalizar a possibilidade de se tratar de um linfoma. Paralelamente, a imunofenotipagem do LCR foi crucial para a confirmação e caraterização da neoplasia de célula B madura, sendo esta compatível com LDGCB.