CASO CLÍNICO: MACRÓFAGOS COM DEPÓSITOS DE HEMOSSIDERINA NO LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO (TRÊS SEMANAS APÓS HEMORRAGIA INTRACRANIANA AGUDA)

Evento: XII Congresso Nacional de Patologia Clínica

Poster Número: 020

Autores e Afiliações:

João A. Pinto, Cristina A. Ferreira.

Serviço de Patologia Clínica – CHTUSJ

Introdução: A atividade fagocítica dos macrófagos é evidenciada no líquido cefalorraquidiano (LCR) após uma hemorragia intracraniana. Numa primeira fase (18-24 horas) é possível identificar eritrófagos no LCR. Os macrófagos com depósitos de hemossiderina surgem aproximadamente uma semana após o evento agudo. Por vezes, estes achados podem observar-se até três meses depois. Assim, a atividade dos macrófagos fornece informações de valor diagnóstico (retrospetivo), e que devem ser ponderadas no estudo citológico do LCR.
Caso clínico: A doente era uma mulher de 73 anos, previamente autónoma. Foi admitida no Serviço de Urgência devido a uma cefaleia holocraniana súbita e muito intensa. Apresentava ptose e estrabismo do olho esquerdo, diminuição da força do membro inferior esquerdo (grau 4), dismetria esquerda e escala de coma de Glasgow de 9/15. A tomografia computadorizada craniana evidenciava hemorragia subaracnoidea perimesencefálica, com extensão para as cisternas pré-pôntica e suprasselar, e com marcada hidrocefalia. Consequentemente, a doente foi intervencionada e colocou-se uma derivação ventricular externa. Posteriormente, a doente foi internada numa Unidade de Cuidados Intensivos (UCI). Durante o internamento (total de 56 dias, 28 dias na UCI), foram realizadas avaliações citológicas, bioquímicas e microbiológicas seriadas do líquido cefalorraquidiano (LCR): 1) o intervalo de células foi 5-113/μL (média: 36/μL); 2) o intervalo de proteínas totais foi 0,04-1,58 g/L (média: 0,29 g/L), lactato 2,49-5,11 mmol/L (média: 3,20 mmol/L) e glicose 63,0-146,0 mg/dL (média: 92,42 mg/dL); 3) os estudos microbiológicos foram todos negativos. Numa das avaliações seriadas do LCR (23 dias após a admissão), o estudo citológico quantificou 4.000 eritrócitos/μL e 71 células/μL. O scattergram side-fluorescence light (SFL) versus side scatter (SSC) mostrava uma dispersão atípica de células, com uma porção significativa na região de alta fluorescência. Por isso, realizou-se citoesfregaço para determinação do diferencial leucocitário, o que evidenciou 33% de células polimorfonucleares e 60% de macrófagos com depósitos de hemossiderina. Apesar destes achados, a doente não apresentou sinais clínicos ou imagiológicos de agravamento da hemorragia intracraniana ou de infeção do sistema nervoso central. Globalmente, a evolução clínica foi favorável, dentro das devidas limitações. No momento da alta médica, a doente encontrava-se consciente, orientada no tempo e no espaço. Registava-se esotropia e ptose do olho esquerdo, e diminuição bilateral da força dos membros superiores (grau 4). Não havia outras alterações neurológicas de relevo.
Discussão: Este caso clínico ilustra a presença de macrófagos com depósitos de hemossiderina no LCR, três semanas após um quadro agudo de hemorragia intracraniana. Embora este achado citológico seja comum neste contexto clínico, e não tenha contribuído para o diagnóstico per se, é importante que ele seja reconhecido e corretamente valorizado enquanto um fenómeno fisiológico normal. Atualmente, as técnicas imagiológicas são rápidas e apresentam excelente sensibilidade diagnóstica para hemorragia intracraniana. Portanto, o conhecimento da fisiopatologia dos macrófagos com depósitos de hemossiderina é de interesse, sobretudo, para não alarmar os médicos assistentes.

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